Aula no Museu de Arte do Rio

No dia 22 de agosto, a turma de “Mídias e expressões artísticas”, das professoras Rosália Duarte e Mirna Juliana, fizeram uma aula no museu. Na visita, a turma teve contato com obras de artes produzidas a partir de livros de escritoras negras, essenciais para a compreensão da constituição de nosso povo: “Um defeito de cor”, de Ana Maria Gonçalves, e “Quarto de despejo”, de Carolina Maria de Jesus. As exposições visitadas foram:  “Carolina Maria de Jesus: Um Brasil para os brasileiros”, “Um defeito de cor”  e “Luz no caminho”.

A seguir, apresentamos um relato da visita a partir dos textos escritos pelas estudantes: Ana Vitoria de Sousa, Fal Aguiar,  Maria Gabriela Alduino, Nathalia Barbieri, Suliane dos Santos e Wânia Arruda. Além disso, trazemos fotografias feitas pela turma, composta também por: Samuel Cruz de Souza e Beatriz de Azeredo.

A exposição “Um Defeito de Cor” teve como inspiração o livro homônimo de Ana Maria Gonçalves, o qual aborda temas, como revoltas negras, empreendedorismo, protagonismo das mulheres negras, culto aos ancestrais e a África contemporânea, entre outros. A exposição é extensa, e mostra um multiplicidade de elementos africanos para contar a história do povo negro com estampas de tecidos, miçangas na entrada da exposição, poemas, fotografias, espelho de madeira e diversos outros elementos que buscam retratar e valorizar a ancestralidade do povo africano.

A exposição nos fez imergir na potencialidade e magia da arte preta e feminina, na reflexão do que foi e do que é o Brasil, um território indígena e afro-brasileiro.

As 400 obras nos resgatam para a ancestralidade feminina e para as histórias dos brasis não protagonizados pela arte eurocêntrica e masculina, presente nos grandes museus e na história da arte.

A exposição sobre Carolina Maria de Jesus é claramente uma homenagem à trajetória e à produção literária da autora mineira que alcançou reconhecimento internacional com a publicação de “Quarto de despejo”, em agosto de 1960. Suas outras criações literárias, incursões como compositora, cantora e artista circense também foram expostas como forma de consagrá-la como uma verdadeira multiartista essencial para a compreensão de outros ângulos da história do país.

A exposição é uma dedicatória à grandeza da escritora e apresentá-la como ela merece ser lembrada: uma mulher negra e artista emancipada, símbolo de resistência e luta política e cultural para o país.

    

Trazendo esses conceitos explorados para a nossa profissão como professoras, precisamos estar atentas para não propagar visões de cultura retrógradas.


Enquanto houver o epistemicídio na educação, continuaremos a não ouvir ou conhecer histórias de vozes poderosas que foram invalidadas devido à sua cor de pele ou condições sociais e financeiras. Acho que o maior aprendizado nessa experiência é que existem diversas culturas, mas nem todas são de fácil acesso. Principalmente as culturas que não são financiadas pela grande indústria midiática.

As exposições representam uma forma de reparação histórica sobre a cultura rica e autêntica dos povos que não tinham voz nem vez. Um mesmo tema com diferentes obras, diferentes materiais e até a acomodação dentro das salas expositivas tinha algo a retratar.

Essa visita levantou questões simples, mas de extrema importância, e que até hoje não tinham sido postas, como: o que são obras de arte? Como vivenciar de fato uma exposição? Como são montadas? Posicionadas? Do que elas falam? O que transmitem? O que o autor sentiu quando a criou e eu o que senti quando a vi?  São questionamentos que ficaram anuviados conforme eu transitava entre as obras. Ao divagar sobre essas questões me pego relembrando características importantes da exposição, as obras distribuídas no ambiente, a ordem de cada uma, os tons, estilos, luzes, tudo interfere em como será observado e consequentemente, em como seria entendido aquela obra.

       
Nas exposições, pudemos perceber como o epistemicídio vem tentando anular a cultura negra, e pessoa preta como produtora de artes e conhecimentos pelo mundo até o presente momento. Um Defeito de Cor traz uma gama de artes de artistas que parecem olhar em nossos olhos e dizerem: ESTAMOS AQUI, VIVOS, E FAZENDO ARTES! Está permitido apreciar, consumir e divulgar a arte preta para compartilhamento no mundo, percebendo o seu potencial e a importância para um futuro com todas as raças e conhecimentos vivos e circulando.

Ao entrar e sair de tantas salas fotografei uma obra de arte que mexeu comigo que não sei descrever.

Deixo apenas palavras que se referenciam ao meu sentimento: Estudante, Favelada, Pobre, Mulher, Desigualdade, Morte/ Assassinato.

A turma estudava o conceito de “epistemicídio” e a visita propunha pensar o lugar das mulheres negras na constituição de nossa história literária. Como o museu estava com uma proposta de apresentar exposições de artistas negros, além dessas exposições, visitamos outras, como “Luz no caminho”, da artista Leoa, mulher preta, cria de Bangu, que retratou o seu cotidiano no bairro através da pintura.

Pinturas fortes, de cunho impressionista e realista no sentido de pintar a realidade. As obras retratam a cultura popular carioca, presente nas regiões da cidade como zona oeste, zona norte, baixada fluminense, comunidades e centro do Rio.

Durante a visita, foi possível perceber o público se identificando com a cultura negra, se sentindo pertencente ao que viam: o espaço, as crianças, o futuro, a educação, os animais, o cinza, a cerveja etc. Luz no caminho foi uma proposta do museu de abrir a casa para novos artistas locais da cidade, e a proposta da artista, na minha opinião, foi iluminar o caminho artístico daqueles que observam suas formas e cores.

Saio do museu apaixonada, com o que consegui ver e sentir durante a caminhada pelos espaços, saio com a sensação de querer consumir  e compartilhar a arte preta e feminina, buscar a minha ancestralidade para andar comigo no tempo presente.

Por fim, concluo minha experiência em diálogo com o conceito de “epistemicídio”, abordado por Djamila Ribeiro e Sueli Carneiro, pois observei em minha visita que as três exposições buscam mostrar e valorizar a existência de um povo, uma cultura, e de pessoas que tiveram suas identidades e seus saberes apagados por meio da violência. Logo, as exposições me tocam ao me mostrarem a importância de reverter esses alagamentos por meio da valorização da cultura negra. Além do mais, foi interessante observar que um ponto em comum nas três exposições é a figura da mulher negra como símbolo de luta social e política.

Enquanto nós como professores formos os agentes do epistemicídio, deixaremos de ver e ouvir relatos como o de Carolina Maria de Jesus e tantas outras nunca sequer citadas. Potências que foram negligenciadas por conta de sua cor, história de vida, condição financeira, ou seja, tudo o que a sociedade busca negar com referência de valor.

Após a visita, a turma recebeu o professor Moacyr Novaes (USP), em um encontro remoto, para discutir sobre o conceito de epistemicídio, após assistirem a uma aula on-line disponível no canal do Grupem.

Produção e revisão da notícia: Mirna Juliana Santos Fonseca

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